Disponibilização: Quinta-feira, 24 de Fevereiro de 2011
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano IV - Edição 900
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nem furto qualificado; (d) a parte ré haveria perdido o direito à cobertura, porque teria declarado, ao contratar, que as chaves
ficariam no quadro de chaves ou com o proprietário do veículo - mas, se isso houvesse ocorrido in casu (cf. a narrativa constante
do boletim de ocorrência juntado a fls. 28-30), o veículo não teria sido furtado; assim, só se poderia concluir que as informações
prestadas pela ré Guaciara haveriam sido inexatas, o que levaria à perda da garantia (Código Civil, art. 766); (e) a ré Guaciara
teria aumentado o risco, porque não possuiria controle adequado de entrada e saída de veículos e outros controles hábeis, o
que significaria agravar os riscos (Código Civil, art. 768); (f) não haveria cobertura para lucros cessantes e danos morais; (g) o
valor apontado pela tabela Fipe já incluiria rodas e pneus e, de qualquer maneira, o valor de R$ 2.000,00 não teria sido provado
por nota fiscal. 3. A parte autora apresentou réplica (fls. 179-131). Não se obteve conciliação (fls. 132-135). 4. Oportunizada a
especificação de provas (fls. 153), manifestaram-se as partes (fls. 157, 158 e 160). Realizou-se audiência de instrução e debates
(fls. 190 e 198-202), em que foi interposto agravo retido (fls. 202). Após, as partes apresentaram seus memoriais (fls.206-208,
210-221 e 227-230). Foi interposto agravo de instrumento (fls. 234-235). 5. Apensados a estes estão os autos de produção
antecipada de provas (583.00.2009.157536-7) proposta por Porto Seguro contra Guaciara, processo esse que foi extinto sem
julgamento de mérito (fls. 85). A respectiva execução, concernente a despesas processuais lato sensu, também já está extinta
(fls. 103). 6. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. 7. Preliminarmente, a ré Porto Seguro não é parte passiva ilegítima,
porque, como se verifica claramente a fls. 64, 88, 104-106 e 108, deu à ré Guaciara cobertura de responsabilidade civil pela
guarda de veículos, nos termos do que dispõe o Código Civil, art. 787: Como explica Humberto Theodoro Júnior: “Pelo art. 787
da atual lei civil, no contrato de que se cuida, a seguradora assume a garantia do pagamento das perdas e danos devidos pelo
segurado ao terceiro. Não é mais o reembolso de seus gastos que o seguro de responsabilidade civil cobre. O ofendido tem,
portanto, ação que pode exercer diretamente, tanto contra o segurado como contra a seguradora” (Curso de Direito Processual
Civil. Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento - I, 43ª edição, Rio de Janeiro, Forense, 2005, p.
158). 8. De meritis, os pedidos da parte autora Alessandro são procedentes em parte contra a parte ré Guaciara apenas. 8.1. A
parte ré Guaciara tem de ser condenada a indenizar à parte autora o valor do veículo (fls. 26-27), porque é indiscutível que foi
subtraído dentro do estabelecimento de Guaciara, que havia assumido o dever de guardá-lo, mediante paga (fls. 28-30, 31, 32
e 59). A indenização deverá corresponder ao valor do veículo na época da subtração, ou seja, a R$ 35.515,00 (fls. 41), montante
esse que não foi impugnado pelas partes rés (fls. 58-60 e 96-103). Sobre esse montante (= R$ 35.515,00 - fls. 41) contar-se-ão
correção monetária (desde a data da propositura desta demanda, segundo a tabela para esse fim expedida pelo E. Tribunal de
Justiça) e juros (desde a citação de Guaciara, segundo o índice de um por cento ao mês - cf. Cód. Civil, art. 406, c. c. Cód.
Tributário Nacional, art. 161, § 1º). Contudo, a indenização devida pela parte ré Guaciara não abrange: (a) as partes integrantes
(rodas e pneumáticos novos, no valor de R$ 2.000,00) e os lucros cessantes (no valor de R$ 24.000,00), cuja existência não
ficou demonstrada nos autos; (b) os danos morais, porque as agruras decorrentes de subtração de veículo - miseravelmente são circunstâncias do cotidiano desta cidade; além disso, a subtração não foi praticada pela parte ré Guaciara, cuja recusa em
pagar não é, em si mesma, causa independente de danos morais, ao lado do ato da subtração. 8.2. A ré Porto Seguro, conquanto
seja parte passiva legítima, não pode ser condenada a indenizar, porque não ficou demonstrado que a subtração do veículo de
Alessandro fosse evento coberto, ou seja, furto qualificado ou roubo. Em primeiro lugar, em sua contestação a própria ré
Guaciara deixou claro que a subtração tinha configurado, quando muito, um furto qualificado, porque, segundo alegou (fls. 59),
“se deduz ter o praticante do delito se valido de ‘micha’ ou artifício semelhante para atingir seu objetivo que era o de subtrair o
veículo”. Porém, não houve prova de que tivesse ocorrido furto qualificado por emprego de chave falsa ou roubo. Em primeiro
lugar, não é crível que a ré Guaciara, interessada em não perder a cobertura securitária, não tivesse dado notícia imediata do
furto qualificado ou do roubo, se algum desses delitos (e não o furto simples) tivesse ocorrido. Isso, porém, não ocorreu, como
se vê a fls. 28-30. Em segundo lugar, como se vê nos autos em apenso, a fls. 19, durante a regulação do sinistro à ré Porto
Seguro não foi dito nada a respeito de um roubo - e, repita-se, não é crível que esse fato não fosse mencionado pelo menos
nessa segunda oportunidade. Em terceiro lugar, caindo esse silêncio absoluto sobre o roubo durante quase todo o processo e
antes dele, não merece fé o depoimento da testemunha Sidharta José de Sá que, como um deus ex machina, como que do nada
veio depor (fls. 200) que o veículo foi subtraído mediante grave ameaça - o que é tanto mais surpreendente, quanto é certo que,
segundo a própria ré Guaciara (fls. 199), ele Sidharta já tinha informado esse roubo na própria data dos fatos, o que é
simplesmente inacreditável, se se considerar que, como ficou dito, a própria Guaciara não disse nada a respeito quando da
regulação do sinistro (fls. 19 dos autos em apenso; fls. 202, verbis “o processo [de seguro] foi aberto com a notícia de um furto,
e não de assalto”). Em quarto lugar, o depoimento de Sidharta é inacreditável, porque não se pode conceber que um assaltante
- como ele diz - tenha anunciado um roubo e levado o veículo roubado mediante... ligação direta (!), enquanto a chave permanecia
placidamente depositada no quadro do estacionamento. Em quinto lugar, não há condições técnicas para avaliar se uma chave
deixada, segundo se alega, no quadro do estacionamento era ou não do veículo do autor (cf. autos em apenso), e nenhuma
outra prova se produziu nesse sentido, de maneira que, excluído o roubo, também não se pode dizer que tenha havido furto
qualificado. Por tudo isso, os fatos em questão não constituíram - ao menos pelo que consta dos autos - evento coberto (= furto
qualificado ou roubo) e, como ficou dito, o pedido de indenização é improcedente contra a ré Porto Seguro. 9. Duas observações
finais impõem-se: (a) ambas as rés são litigantes de má fé: a ré Porto Seguro, porque negou fato incontroverso, decorrente da
apólice de seguro que ela mesma emitira, qual seja, a sua legitimidade passiva; a ré Guaciara, porque, contra as declarações
que ela mesma prestara antes do processo, veio alegar roubo (fls. 230), contra a letra de sua própria contestação (fls. 59).
Assim, condeno cada ré a pagar, cada qual, 0,5% sobre o valor da causa, a título de multa, em favor do Estado, e ainda
acrescento à ré Guaciara o dever de indenizar à parte autora, pelo valor de 2% sobre o valor da causa, a demora causada à
marcha do processo, por sua renitência; e (b) deve ser apurado se Sidharta (fls. 200) prestou ou não falso testemunho, de modo
que em seu desfavor tem de ser requisitado inquérito policial. 10. Do exposto, julgo procedentes em parte os pedidos deduzidos
por Alessandro de Paiva e Silva e condeno Guaciara Paulo Da Silva ME a pagar-lhe R$ 35.515,00, montante sobre o qual se
contarão correção monetária (desde a data da propositura desta demanda, segundo a tabela para esse fim expedida pelo E.
Tribunal de Justiça) e juros (desde a citação de Guaciara, segundo o índice de um por cento ao mês - cf. Cód. Civil, art. 406, c.
c. Cód. Tributário Nacional, art. 161, § 1º). Declaro resolvido o mérito da demanda (Código de Processo Civil, art. 269, I). Entre
Alessandro e Guaciara, como ambas as partes sucumbiram, não há honorários advocatícios e cada parte, respeitada a isenção
de que porventura goze, pagará as custas e despesas processuais que houver desembolsado. Entre Alessandro e Porto Seguro,
como somente Alessandro sucumbiu, Alessandro pagará, respeitada a isenção de que goza, as custas e as despesas processuais
desembolsadas por Porto Seguro e também os honorários advocatícios, estes os quais arbitro em quinze por cento sobre o
valor da condenação. Por conta da litigância de má fé, as partes rés pagarão ainda: (a) Guaciara e Porto Seguro, 0,5% sobre o
valor da causa, ao Estado; e (b) Guaciara, 2% ao valor da causa, a Alessandro. Façam-se as comunicações e anotações de
praxe. P. R. I. São Paulo, 3 de fevereiro de 2011 AD. JOSUÉ MODESTO PASSOS Juiz de Direito Auxiliar Preparo: R$ 789,68. ADV RENATO MALDONADO TERZENOV OAB/SP 140534 - ADV ILTON ANASTACIO OAB/SP 94628 - ADV JOMATELENO DOS
SANTOS TEIXEIRA OAB/SP 54685 - ADV JUSTINIANO PROENCA OAB/SP 43319 - ADV LUCAS RENAULT CUNHA OAB/SP
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